sexta-feira, maio 22

Conto

O medo como pior dos inimigos
Juliana era uma rapariga muito inteligente, culta, que detestava conversas fúteis e que nunca ninguém vira sem um sorriso na cara. Não era a melhor aluna da turma, nem a mais popular. Tocava piano desde muito nova. Tinha sido convidada a participar num evento onde estariam os melhores pianistas do mundo. Foram semanas de muitos e intensos ensaios. Foram momentos de muita tensão e disciplina, que se deveriam revelar no dia do espectáculo. Juliana esforçou-se. Esteve atenta a todos os ensaios, a tudo o que o professor lhe dizia e cada pormenor estava na sua cabeça. O tempo passou e a véspera do grande dia chegou, Juliana estava contente com aquela oportunidade e ao mesmo tempo tremia de medo. Sentou-se ao piano e não conseguiu lembrar-se de nada. Ela sabia que era boa no que fazia, mas o medo apoderara-se dela de tal forma que ela se tinha esquecido das notas, da forma de tocar, de tudo.O dia do concerto amanheceu claro e tudo parecia estar no bom caminho. Juliana caminhou até ao piano de sua casa na esperança de ver contrariada a ideia de que se tinha esquecido de tudo, mas os nervos continuavam lá, agora ainda mais visíveis. Atormentava-a o facto de pensar que nunca seria capaz de brilhar. Falou com os pais, mas mesmo assim, estes decidiram levá-la e quando chegaram ao local do espectáculo, falaram com o professor, que lhes pediu calma. Assim que o viu, Juliana foi a correr, contar-lhe que se tinha esquecido de tudo e pediu para a trocarem.António, professor há mais de vinte anos, respondeu-lhe com um sorriso:-Não te esqueceste de nada. Acontece que estás nervosa e parece que tens uma branca, mas quando subires aquele palco, vais ver que isso não passa de uma impressão tua.-Mas eu tentei em casa.... E não sabia nada.Juliana estava agora verdadeiramente nervosa, estava em pânico. A respiração ofegante, fazia prever que a jovem pianista se recusaria a subir ao palco.O grande momento chegou e o professor fez-lhe sinal que subisse. Juliana subiu a tremer e sentou-se ao piano. O espectáculo começou e chegou a vez da menina tocar. E Juliana fê-lo. Fê-lo de uma maneira tão bonita que encantou, um por um, todos os presentes na sala. À medida que o espectáculo avançava, era cada vez maior o número de pessoas que elogiava a pianista. Ouviu-se a última tecla do piano tocar e todo o auditório se levantou para aplaudir. Juliana levantou-se do banco e ainda a tremer, veio agradecer os aplausos. Olhou para o professor que lhe sorriu. Assim que desceu do palco, foi ter com o seu professor de piano. -Eu sabia que eras capaz. Estiveste fantástica.
Juliana tinha agora ficado corada e feliz com as palavras de António.
-Eu pensava que nunca seria capaz.
Fechou os olhos e apertando as mãos contra o peito, disse:
-Sabe uma coisa? Às vezes somos levados por uma ignorância pessoal, que nos faz pensar que não somos capazes de fazer alguma coisa. Normalmente não nos conhecemos bem, não sabemos daquilo que somos realmente capazes. Somos induzidos no sentido de desistir e depois ficamos aliviados, mas a pensar como seria se.... E há um sentimento. Algo que nunca nos deixa avançar, que nos faz recuar cada vez mais. O medo, ele é o culpado de muitas desistências. Hoje aprendi uma coisa , o medo é o pior dos nossos inimigos. Se queremos fazer uma coisa, fazemo-la e quando sentimos medo basta pensar que ele.... ele não é ninguém, não é nada, ele vem e vai, chega quando menos precisamos dele e só vai embora quando ganha a batalha. Mas hoje fui eu quem ganhou a batalha. Hoje fui a pior inimiga do medo.
O professor acenou com a cabeça, concordando com a aluna e os dois abraçaram-se.
Agora Juliana já passou por vários espectáculos, foi a diversos países, recebeu inúmeros prémios. E o medo ? O medo vem sempre ter com ela, mas, quando ela sai ele fica em casa e assim que ela sobe ao palco ele dá-se por vencido.

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