segunda-feira, junho 15

O que arde cura

Ao pensar sobre o meu percurso literário este ano, só me vêm à mente provérbios! Subitamente, dou por mim a identificar-me com um querido amigo meu que faleceu há uns anos, pobre coitado... José Fraga era o seu nome e nunca pensei vir a escrever acerca dele. O Sr. Fraga, como carinhosamente o chamava, tinha estado na Marinha muitos anos e era um verdadeiro dicionário de provérbios. Uma pessoa culta, que ao longo dos seus oitenta e tal anos de vida havia absorvido muito. Lembro-me tão bem do que me dizia... Cada vez que me queixava de algo, lá ouvia do outro lado um “Ó menina Sara, já se sabe...!”, seguido de um provérbio. Em cada frase do Sr. Fraga lá aparecia pelo meio um dos seus bons provérbios! Sim, porque o Sr. Fraga, para além de poeta e ‘recitador de provérbios’, era um criador de provérbios. Podem ainda não ser famosos, mas comigo pegaram...

“Nem tudo o que parece é” (já o dizia o Sr. Fraga) – e eu que o diga! Quando decidi inverdar por esta área, estava decidida que era uma devoradora de livros, uma autêntica “‘monstra’ das bolachas”. Desde que sei ler que sempre me acompanho de livros; está-me no sangue ser viciada em leitura (e “Filho de peixe sabe nadar!”). Chamavam-me “a nerd dos livros”, perguntaram-me se queria ser bibliotecária, se sabia falar e ouvir ou se só sabia ler e escrever, escrevi um artigo para o jornal da escolha sobre o poder do Livro afim de incentivar à leitura e à ida à Biblioteca... E naquele momento em que preenchi Línguas e Humanidades avisaram-me logo: “Vais ter de ler muito!”. “Para mim isso não é problema”, retorqui. A verdade é que foi. Não digo por falta de vontade, mas por falta de tempo. Por vezes preferi abdicar de certas recensões críticas e fazer outros trabalhos porque pensava “Mais vale um pássaro na mão que dois a voar”. E ok, talvez por um pouco de falta de vontade também...(há que admitir certo? “A mentira tem perna curta!”) A verdade foi que aqui não li bem sobre o que queria: ou me davam o livro ou dois por onde escolher. E comecei em cheio, com Memórias de Adriano. Apesar de o achar interessante e gostar de História, ia morrendo de tédio. Mas aprendi. Aprendi muito sobre a antiguidade e o modo de vida na época.E “Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura”, portanto aos poucos e poucos fui mudando... Que dizer da obra de António Aleixo? A boa da quadra! Deu-me orgulho de puder dizer que sou portuguesa. Falou-me de tradição e enriqueceu-me com as suas palavras que, embora tão simples, estão tão cheias de sabedoria. Mia Couto? Contos que me deixaram de boca aberta, desfechos inesperados e surpreendentes de histórias de vidas humanas. E as colectâneas? As colectâneas foram a cereja no topo do bolo! Trouxe delas um pouco comigo e principalmente uma vontade arrebatadora de escrever. “Deus dá nozes a quem não tem dentes”, pensei após esta leitura, por ser tão rica e muitos nem lhe pegarem. No fundo, comecei mal e sem vontade mas, lá está, “devagar se vai ao longe”!

Custou, não digo que não. Por vezes não tinha paciência para ler certas coisas, o que até me deixou espantada comigo mesma. Chega-se a casa, meio esfolada pela vida, absorvida pelo stress, de olhos cansados a pedir descanso e tudo o que menos nos apetece é precisamente ir ler sobre a vida do Adriano lá em Roma há uma porrada de anos atrás. Mas “Quem te avisa teu amigo é” e como tal, tentei seguir os conselhos que me davam. Resultado final? Aprendi tanto sobre tanta coisa que sinto que cresci imenso. Não se tratam de meros livros, são folhinhas de papel que valem ouro e quantas mais lemos mais ricos nos tornamos. Foi uma luta árdua mas, e viva o meu caro amigo Fraga, “mais vale tarde do que nunca”!

2 comentários:

Joans disse...

Nem vou repetir que adoro os teus textos, hoje vou acrescentar informação aos meus elogios: este texto está especialmente brilhante pela linha de pensamentos. Conseguiste que tudo fizesse sentido.
Embora seja uma das "baldas" à leitura, dou-te razão em tudo o que posso dar.

Joana Marcelino disse...

Concordo com a Joans no sentido de o texto estar espetacular! Escreves de uma maneira cativante e muito interessante! Gostei muito do teu texto e da maneira como relacionaste os provérbios populares!